Sob o sol quente de Beja – Miguel e João

Tempo de Leitura: 15 minutos

O reencontro do Miguel e do João marca o início de uma viagem emocional entre memórias e segredos.

Neste conto, o café tornar-se-á palco de perguntas não feitas e olhares carregados de significado.

Beja, com o seu ritmo calmo, contrasta com o tumulto interior que ambos sentem ao enfrentar um passado que nunca foi encerrado.

Que motivos trouxeram João de volta? E que palavras ficaram por dizer naquela despedida há tantos anos?

O chamamento da cidade de Beja

Beja, com as suas muralhas de pedra quente e ruas estreitas, parecia eternamente parada no tempo.

Em pleno Julho, o calor ondulava no ar, transformando a paisagem numa miragem dourada. O Miguel ajustou os óculos enquanto saía da biblioteca municipal, um refúgio de frescura onde trabalhava como arquivista.

Desde jovem, os livros tinham sido os seus melhores amigos, oferecendo-lhe aventuras e histórias que preenchiam o vazio deixado por uma rotina monótona e uma solidão que ele fingia não perceber.

Cruzou a Praça da República com passos lentos, detendo-se por um momento para admirar a luz do sol a tingir de laranja as fachadas caiadas.

Foi então que ouviu algo: um som delicado, melódico, que parecia escapar de outro tempo. O som de um violão.

Era uma melodia suave, impregnada de nostalgia, que ecoava sob os arcos do castelo, como se a cidade quisesse contar-lhe um segredo.

A curiosidade venceu o calor, e o Miguel seguiu o som.

No topo da escadaria, encontrou um homem. Estava sentado no parapeito, de costas para o horizonte, o violão pousado no colo, como se a música fosse uma extensão do seu próprio ser. O Miguel reconheceu-o imediatamente. João.

João, o amigo da adolescência, o rapaz de sorriso fácil que deixara Beja há muitos anos, partindo para Lisboa em busca de algo que nunca explicara.

A última vez que se viram, tinham ambos dezanove anos, e o Miguel ainda recordava o nó na garganta ao ver o João desaparecer entre as carruagens da estação.

— João? — chamou, com a voz trémula.

O homem ergueu o olhar, surpreendido, mas logo um sorriso largo iluminou-lhe o rosto.

— Miguel. Não esperava encontrar-te tão cedo.

A familiaridade do sorriso aqueceu o coração de Miguel, mas a surpresa da presença de João em Beja deixou-o sem palavras.

Sentia-se como uma página em branco, incapaz de expressar tudo o que lhe passava pela cabeça.

Enquanto se aproximavam um do outro, o violão ficou esquecido, repousando no parapeito como uma testemunha silenciosa.

As muralhas de Beja pareciam prender o momento no tempo. O Miguel não conseguia decidir se sentia alegria, desconforto ou apenas uma confusão inquietante.

O João, por sua vez, parecia à vontade, como se nunca tivesse partido.

— Tens tempo para um café? — perguntou o João, quebrando o silêncio.

O Miguel hesitou por um momento. Havia tanto que queria perguntar, mas não sabia por onde começar.

Ainda assim, o convite era uma oportunidade de reacender algo que pensava perdido.

— Claro, por que não? — respondeu, tentando soar casual.

Enquanto desciam as escadas em direção à Praça da República, O Miguel não conseguia afastar a sensação de que algo estava prestes a mudar.

Entre eles pairava o peso do passado por resolver e a promessa de uma conversa que podia reabrir feridas ou criar algo.

Por entre memórias e silêncios

Os dois caminharam em direção ao jardim público, tal como faziam quando eram jovens. As sombras das árvores ofereciam algum alívio do calor, mas o Miguel sentia-se inquieto.

O João estava ali, ao seu lado, mas parecia quase um estranho. Ainda assim, o timbre da sua voz era o mesmo, assim como o jeito descontraído com que caminhava, como se o mundo lhe pertencesse.

— Pensei que tinhas ficado por Lisboa — disse o Miguel, quebrando o silêncio.

— Fiquei… por um tempo. Mas às vezes é preciso voltar a casa.

“Casa.” A palavra ecoou nos pensamentos do Miguel. Seria Beja a casa de João? Ou teria ele regressado por outro motivo?

Conversaram sobre coisas mundanas: o trabalho do Miguel na biblioteca, as noites boémias do João em Lisboa. Mas havia algo subjacente, uma tensão que ambos reconheciam e nenhum ousava abordar.

O Miguel lembrava-se das tardes passadas juntos na juventude. Sentados neste mesmo jardim, tinham partilhado sonhos, poemas, beijos secretos.

Mas havia algo que nunca tinham dito. Algo que, na altura, parecia impossível de nomear.

— Por que voltaste? — perguntou o Miguel finalmente, com a voz embargada pela hesitação.

O João suspirou, o olhar perdido na distância.

— A cidade nunca me deixou verdadeiramente; e acho que tinha contas a ajustar com o passado.

O Miguel não soube o que responder. Limitou-se a observar o João, sentindo-se simultaneamente feliz por tê-lo de volta e apreensivo com o que aquele regresso poderia significar.

A conversa no café foi marcada por um misto de leveza e subentendidos.

O Miguel e o João riram de histórias da adolescência, trocaram memórias de amigos em comum e falaram dos dias de verão passados a explorar os cantos de Beja.

No entanto, entre cada frase, havia pausas carregadas, como se ambos estivessem à espera de algo mais.

Quando finalmente se levantaram para sair, o sol já começava a descer, tingindo a cidade com tons de dourado.

Caminharam juntos até ao largo principal, onde as suas direções se separavam.

— Foi bom rever-te, Miguel — disse o João, com um sorriso que parecia sincero, mas que também carregava algo de inacabado.

— Também gostei… não esperava esta surpresa — respondeu o Miguel, enquanto lutava para manter a voz firme.

— Talvez possamos continuar esta conversa outro dia. Não quero que fiques a pensar que regressei apenas por nostalgia. Há mais coisas que me trouxeram de volta a Beja.

O Miguel franziu o sobrolho, intrigado, mas o João apenas acenou antes de virar a esquina.

Enquanto o via desaparecer, o Miguel sentiu o mesmo vazio de anos atrás, mas desta vez, algo era diferente: havia uma promessa implícita de que o reencontro ainda não estava completo.

Motivo para se reunirem de novo

Dois dias depois, o Miguel estava a organizar um lote de cartas antigas na biblioteca quando recebeu uma mensagem de João:

“Se tiveres um tempo livre, gostava de te mostrar algo importante. Encontro-te no castelo às 18h?”

O Miguel não conseguiu resistir à curiosidade. À hora marcada, dirigiu-se ao castelo, onde encontrou o João de pé junto à muralha, com o violão na mão e um olhar determinado.

— Quando era miúdo, o castelo era o meu lugar favorito. Nunca te contei isto, mas era aqui que vinha para tocar quando não sabia como lidar com o que sentia. — o João fez uma pausa, os olhos fixos no horizonte. — Agora, regressei porque quero tentar pôr em ordem algumas coisas que deixei por dizer… contigo.

O Miguel sentiu o coração acelerar. Aquilo não era apenas sobre uma amizade.

O João voltara para Beja porque precisava de enfrentar os seus próprios fantasmas, e o Miguel fazia parte dessa história.

O Miguel olhou para João, enquanto tentava decifrar aquelas palavras, mas sentiu-se incapaz de responder.

Havia algo no tom de João, no brilho hesitante dos seus olhos, que falava diretamente a uma parte de si que ele preferia manter adormecida.

— Não sei o que queres dizer com isso, João — murmurou o Miguel, desviando o olhar para as muralhas à sua volta.

O João respirou fundo, como quem prepara uma confissão difícil.

— Quero dizer que o que sinto por ti não mudou, Miguel. Na verdade, acho que cresceu. Durante todos estes anos, pensei no que poderia ter sido se tivesse ficado, se tivesse dito alguma coisa antes de partir. Mas tive medo.

O Miguel sentiu o coração a apertar. As palavras do João eram tudo o que ele nunca quis admitir a si mesmo. Durante anos, guardou as lembranças do amigo como algo precioso, mas intocável.

Agora, a presença dele ameaçava quebrar a estabilidade que ele construíra.

— João, isso foi há tanto tempo… — começou o Miguel, mas a voz tremeu.

— Eu sei. Mas a verdade não desaparece só porque tentamos ignorá-la — respondeu o João, aproximando-se um passo. — Não espero nada de ti, Miguel. Só queria que soubesses o que sinto.

O silêncio que se seguiu foi quase insuportável. O Miguel queria responder, mas sentia-se dividido. Havia o Rui, que era gentil, dedicado, e parte da sua vida há dois anos, isto, é o Miguel namorava.

Mas agora, havia também o João, com quem partilhava uma história que nunca chegou a ser vivida.

O João pousou a mão no ombro do Miguel, num gesto calmo, mas carregado de significado.

— Pensa no que te disse. Não tens de decidir nada agora.

Antes que o Miguel pudesse dizer algo, o João afastou-se, desaparecendo pelas escadas que desciam do castelo.

O Miguel ficou sozinho, com a noite a envolver as muralhas numa penumbra azulada. Sentia-se à deriva, incapaz de organizar os pensamentos.

Um fim de semana que complicou tudo

O Rui chegou a Beja na sexta-feira, como fazia todas as semanas.

O Miguel e ele tinham uma rotina bem definida: jantavam no restaurante preferido de ambos, passeavam pelo centro histórico, e passavam a noite juntos no apartamento do Miguel.

Mas, desta vez, algo estava diferente. O Miguel sentia-se inquieto, com a mente constantemente a voltar à conversa com o João no castelo.

— Estás distante hoje — comentou o Rui, enquanto bebiam vinho na varanda.

— Estou só cansado — respondeu o Miguel, evitando o olhar do namorado.

O Rui colocou a mão sobre a dele, tentando transmitir conforto.

— Sabes que podes falar comigo, não sabes?

O Miguel sorriu levemente, mas não conseguiu responder. O Rui sempre fora compreensivo, mas a ideia de confessar que estava a ser consumido por sentimentos por outra pessoa parecia-lhe impensável.

Na manhã de sábado, enquanto o Rui dormia, o Miguel recebeu outra mensagem do João:

“Gostava de te ver. Encontro-te no jardim às 16h?”

O Miguel ficou a olhar para o telemóvel durante longos minutos. Sabia que devia ignorar a mensagem. Mas não conseguiu.

— Tenho de resolver umas coisas em casa da minha mãe, não me demoro — disse ao Rui, enquanto saía apressado de casa.

O Rui acenou, ainda a organizar a mala para a viagem de regresso a Portimão no domingo.

Um segredo que nasce

No jardim público, o João já o esperava, sentado num banco à sombra de uma grande árvore. O violão estava encostado ao tronco, mas parecia esquecido.

— Pensei que não virias — disse o João, quando o Miguel se aproximou.

— Eu não devia ter vindo — respondeu o Miguel, mas sentou-se ao lado dele mesmo assim.

O silêncio entre os dois era pesado, mas o João finalmente quebrou-o.

— Não quero ser um problema na tua vida. Mas não consigo fingir que não me importo contigo.

O Miguel olhou para João, e naquele momento, viu algo que não conseguia ignorar: uma vulnerabilidade que o puxava como um íman. Ele sabia que o que estava prestes a fazer era errado, mas sentia-se incapaz de resistir.

Sem pensar, aproximou-se. O primeiro toque foi hesitante, mas quando os lábios se encontraram, a hesitação deu lugar a algo mais profundo, mais urgente.

Quando se afastaram, o Miguel sentiu o coração a bater descontrolado.

— Isto não devia ter acontecido — sussurrou, mas a voz soava mais fraca do que convincente.

— Talvez não. Mas aconteceu. E agora? — perguntou o João, com os olhos presos nos de Miguel.

O Miguel não respondeu. Levantou-se rapidamente e saiu, deixando o João sentado no banco, a olhar para a sombra que ele deixara para trás.

A semana que se seguiu ao beijo no jardim foi um turbilhão para o Miguel.

As memórias daquele momento assombravam-no a cada instante. Durante o trabalho na biblioteca, enquanto jantava sozinho, até nas chamadas com o Rui, sentia o peso de algo inconfessável.

Ele sabia que o que fizera era uma traição, mas não conseguia afastar o João dos seus pensamentos.

Foi numa quarta-feira, quando o Miguel recebeu mais uma mensagem do João, que a barreira que mantinha entre eles começou a ceder por completo.

“Ainda estou a pensar no que aconteceu. Queria falar contigo. Sinto que precisamos de mais tempo para entender isto.”

O Miguel hesitou antes de responder, mas acabou por ceder.

“Também acho que precisamos de falar. Vamos encontrar-nos esta noite?”

Porém, o João sugeriu algo que Miguel nunca imaginara:

“Não. Encontro-te no teu apartamento. Às 23h?”

O Miguel ficou a olhar para o telemóvel, com o coração acelerado.

Nunca tinha trazido o João para aquele espaço, que pertencia tanto a ele quanto à sua relação com o Rui.

Durante longos minutos, lutou com a decisão, mas no final enviou apenas uma palavra. “Vem.”

Às 23h em ponto, o Miguel ouviu a campainha. O som ecoou pelo apartamento silencioso, trazendo com ele uma mistura de excitação e culpa.

Abriu a porta para encontrar o João, de jeans e uma camisa desabotoada, com um olhar que misturava nervosismo e determinação.

— Tinha medo que não respondesses — disse o João, entrando no pequeno apartamento.

O Miguel fechou a porta atrás dele, sem saber como começar. Sentaram-se à mesa da cozinha, o silêncio entre eles tão carregado que parecia um terceiro ocupante na sala.

— Não sei o que estou a fazer, João — confessou o Miguel finalmente. — Isto… não é justo. Para ninguém.

— O que sentimos raramente é justo, Miguel. Eu sei que tens alguém, e não espero que tudo se resolva de um dia para o outro. Mas não posso fingir que não te quero — respondeu o João, aproximando-se.

A intensidade das palavras do João era mais do que o Miguel conseguia suportar.

Tentou responder, mas o João colocou a mão sobre a sua, num gesto calmo, mas firme.

— Se me disseres para ir embora agora, eu vou. Mas se não disseres nada… — deixou a frase suspensa, os olhos fixos nos de Miguel.

O Miguel não disse nada. Deixou que o silêncio falasse por si.

O João levantou-se e deu a volta à mesa, parando ao lado do Miguel. Sem hesitar, inclinou-se e beijou-o. Desta vez, não havia hesitação ou resistência.

O Miguel correspondeu com urgência, como se todo o peso daquela semana finalmente tivesse encontrado escape.

O beijo levou-os ao quarto. Cada passo era uma quebra nas barreiras que o Miguel tinha erguido para se proteger.

Quando chegaram à cama, o Miguel sentia-se como se estivesse numa linha invisível entre o certo e o errado, mas a única coisa que importava naquele momento era o João.

Deitaram-se juntos, os gestos inicialmente cautelosos, mas rapidamente cheios de intensidade.

O João tocava-o como se quisesse conhecer cada parte sua, e o Miguel entregava-se completamente, esquecendo tudo o resto.

Os beijos tornaram-se mais urgentes, os corpos a aproximarem-se numa sincronia que parecia instintiva.

O João deslizou as mãos pelas costas do Miguel, puxando-o para mais perto, enquanto os dois se moviam na cama.

O Miguel perdeu-se no toque de João, nas mãos firmes que exploravam a sua pele, no calor que crescia entre eles, nas ereções que se sentiam a cada movimentação.

Depois de as línguas se entrelaçarem, de estarem bem quentes e cheios de vontade de se envolverem finalmente, o Miguel desabotoou a camisa do João lentamente, com os dedos a tremerem, não de hesitação, mas da intensidade do momento.

O João observava-o, sendo que os olhos ardiam com uma mistura de desejo e carinho que o desarmava por completo.

Quando a camisa caiu no chão, o Miguel correu os dedos pelo peito de João, seguido dos seus lábios. A ponta da língua tocava a pele, os mamilos, as costelas.

O João sentia a respiração do Miguel acelerada e respirava fundo ao seu ouvido.

— Tens ideia do quanto esperei por isto? Quantas vezes imaginei-te duro… a minha boca a sentir o teu pau? — sussurrou o João, antes de voltar a beijá-lo de forma fugaz, desta vez mais profundo, como se tentasse capturar todos os anos perdidos num único momento.

As roupas foram caindo no chão, peça por peça, até estarem completamente expostos um ao outro.

A intensidade aumentava com cada toque, com cada beijo.

A dado momento, o João inclinou-se sobre Miguel, os lábios a traçar um caminho pelo pescoço até ao peito, demorando-se em cada ponto sensível, enquanto as mãos percorriam as ancas de Miguel, despertando cada parte adormecida do seu corpo.

Não demorou até o João começar a masturbar o Miguel. Apertava-lhe firmemente o membro, onde a cada subida e descida, sentia as veias salientes.

Por sua vez, o Miguel puxou o João para mais perto, com o calor dos corpos a preencher o quarto escuro. Era uma noite quente, os dois suavam e o suor colava-se.

Com os minutos a passar, os movimentos tornaram-se mais fluidos, guiados pelo desejo crescente que parecia consumir os dois. Gaveta aberta da mesa de cabeceira, preservativos em cima da cama, lubrificante pronto a ser usado.

O Miguel foi o primeiro a ficar de quatro, pronto a ser penetrado pelo João.

Quando os seus corpos se uniram, o Miguel deixou escapar um gemido abafado, enquanto o João sussurrava o seu nome e comentava como o Miguel era apertado.

A velocidade da penetração aumentou, o João agarrou com força na anca do Miguel e perguntou se podia ser mais brusco, mais agressivo.

A resposta foi positiva e o Miguel revirava os olhos a cada estucada. O rabo dele levava palmadas, era puxado e pressionado com a força que andava a imaginar há dias seguidos.

A intensidade do momento era avassaladora, cada toque, cada movimento carregado de significado.

Perderam-se um no outro, num ritmo que os conectava não apenas fisicamente, mas emocionalmente.

Aqui, o João veio-se abundantemente, retirando o preservativo no momento certo e enchendo o corpo do Miguel de leite quente.

Escorria pelas costas, pelo rabo abaixo, num timing quase perfeito.

Logo de seguida, o João estimulou também o Miguel, pedindo-lhe que se viesse na sua boca, pois desde que tinha ido para Lisboa que fantasiava com esse cenário.

O Miguel e João ficaram deitados lado a lado, com a respiração ainda pesada e o quarto mergulhado numa penumbra cálida.

O calor dos seus corpos juntos contrastava com o frio que lentamente se instalava no coração do Miguel. Olhando para o teto, a realidade começou a infiltrar-se.

Ele sabia que aquilo tinha sido mais do que um momento de desejo. Fora uma quebra, uma linha cruzada que não podia ser desfeita.

— Isto muda tudo — murmurou o João, virando-se para o lado, a observar Miguel com um olhar intenso, como se tentasse medir a sua reação.

O Miguel assentiu lentamente, mas manteve os olhos fixos no teto.

— Muda mesmo — respondeu, com a voz rouca.

Por alguns instantes, o silêncio dominou o quarto. O peso do que acabara de acontecer parecia ocupar todos os espaços.

O João estendeu a mão, tocando no ombro do Miguel com delicadeza.

— Não precisas dizer nada agora… Mas não me digas que isto não significou nada para ti.

O Miguel virou-se para encará-lo, os olhos cheios de conflito.

— Significou. É isso que torna tudo tão… difícil.

O João franziu o sobrolho, mas não afastou o olhar.

— Então, por que estás a afastar-te agora?

O Miguel sentou-se na beira da cama, esfregando as mãos no rosto como se tentasse limpar a confusão. As palavras eram difíceis de formar, mas precisava de ser honesto.

— Porque tenho o Rui. E porque, mesmo que não o tivesse… isto é mais complicado do que imaginas.

O João levantou-se também, pegando instantaneamente as roupas espalhadas pelo chão. Vestiu-se lentamente, com o silêncio pesado como chumbo.

— Eu sabia que era um risco estar contigo. Sabia que podia acabar assim — disse ele, com o tom carregado de tristeza e frustração. — Mas não me arrependo.

O Miguel olhou para ele, surpreso.

— Não te arrependes?

O João sorriu levemente, mas o sorriso não chegou aos olhos.

— Não. Porque agora sei que não imaginei isto tudo sozinho. O que aconteceu entre nós… o que sentimos… é real. E por mais que tentes fugir disso, Miguel, não podes fingir que não é.

O João colocou a camisa e caminhou até à porta. Parou, com a mão pousada no puxador, e virou-se uma última vez.

— Mas também não vou forçar-te. Tens de decidir o que queres. Só não demores demasiado.

A porta fechou-se atrás dele, e o Miguel ficou sozinho no quarto vazio. Sentia-se vazio também, como se o que restava de si estivesse preso entre duas vidas que não conseguia reconciliar.

O Fim: A escolha que não foi feita

Nas semanas seguintes, o Miguel tentou continuar com a sua vida normal. O Rui visitava-o aos fins de semana como sempre, e o Miguel fazia o possível para fingir que tudo estava bem. Mas, por dentro, sentia-se cada vez mais distante.

Por outro lado, evitava o João. Ignorava as mensagens e inventava desculpas para não o encontrar. Mas mesmo assim, não conseguia afastá-lo dos pensamentos.

Até que, um dia, ao regressar da biblioteca, encontrou uma carta presa à sua porta. Era do João.

“Miguel,

Já não posso continuar nesta espera. Fui para Beja para tentar resolver o que sentia, mas percebi que a tua hesitação me magoa mais do que qualquer resposta definitiva. Não posso ficar parado enquanto tu decides o que fazer com o teu coração.

Espero que encontres paz. Sei que um dia vais perceber o que realmente querias. Mas, para mim, chegou o momento de seguir em frente. Adeus. João.”

O Miguel sentiu o peito apertar. Sabia que aquilo era o fim, mas também sabia que era culpa sua. A carta caiu-lhe das mãos, e ele ficou parado à porta, incapaz de entrar.

Por fim, o Miguel fez a única coisa que sabia fazer bem: guardou tudo dentro de si, como mais uma história inacabada, e continuou a viver.

Mas, à noite, quando estava sozinho, não conseguia evitar pensar em como seria a sua vida se tivesse escolhido diferente.

E assim, o sol de Beja, que outrora iluminara possibilidades, tornou-se uma lembrança amarga do que nunca teve coragem de agarrar.

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